quinta-feira, 15 de março de 2012

Seu Vicente

Seu Vicente mora na estrada velha de Barreiros. Aposentado, acorda cedo, toma café com rosca de polvilho, dá alpiste ao coleirinha e vai pescar. Antigamente, tinha uma canoa; era um bom remador. Mas, aos 81 anos de idade, seus braços ficaram cansados e seu Vicente trocou a canoa por um barquinho de alumínio a motor. Com dificuldade, alinha as estivas, pega o balaio e empurra o barquinho até o mar, que tá lisinho, lisinho. Seu Vicente ainda não perdeu as esperanças de pescar um peixe graúdo. E, todos os dias, larga próximo a pedra Faria o espinhel. Quando era moço, bastava lançar o anzol que, quase no mesmo instante, vinha um peixe agarrado. Era uma fartura só – comenta. Agora, não. Agora, ele deixa o espinhel a noite toda e pela manhã, quando vai verificar, os anzóis vêm vazios – um bagrinho e um baiacuzinho sempre têm. Mas isso não se come – afirma. Seu Vicente desliga o motor do barquinho, acende um cigarrinho (ainda de palha) e pensa nos filhos, na mulher fazendo o almoço... E, quando admira o lugar onde nasceu, fica triste; não acredita que a praia de Barreiros esteja poluída. No começo ele também jogava o esgoto no mar. Depois veio a canalização e o esgoto foi mandado pra Potecas. É o progresso – murmura. Seu Vicente ultimamente vive mais preocupado ainda. O motivo? É que andam dizendo que vão construir uma beira-mar em Barreiros. Falta apenas a autorização de um órgão ambiental. Seu Vicente não entende isso direito. Sabe apenas que qualquer alteração que se faça na natureza o homem acaba pagando caro. Seu Vicente tem, sim, um carrinho. Mas quase não o tira da garagem; prefere andar a pé ou de ônibus. Será que as pessoas não podiam fazer o mesmo? Ou, ao invés de aterro, não podiam aproveitar melhor esse mar? Seu Vicente liga o motor do barco. O balaio de peixes? Vazio...

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