segunda-feira, 2 de abril de 2012

Seu Otávio

Seu Otávio não gosta de política. Diz que os políticos só aparecem em época de eleição; que só fazem leis em benefício próprio ou de quem tem dinheiro; que não ligam pro povo etc. Ainda assim, seu Otávio não perde um pleito. Acorda cedo (quer ser o primeiro da fila), coloca o seu surrado terninho de linho branco e sobe o morro da Rua Capitão Pedro Leite pra cumprir o dever cívico. Andando com dificuldade, não tem mais a disposição da juventude, seu Otávio leva no bolso do paletó os nomes dos candidatos anotados num papelinho. Não quer errar na hora de apertar aqueles botõezinhos estranhos da maquininha eletrônica. Seu Otávio não conhece nenhum candidato, nem mesmo viu suas fotos na TV. Mas não liga pra isso. O voto não é obrigatório? Outro dia, seu Otávio ouviu um entendido falar que o povo brasileiro não sabe votar. Seu Otávio não gostou; não concordou. Não é o povo que não sabe votar; as opções que se apresentam é que são ruins, não prestam. Seu Otávio argumenta: quem é honesto, trabalhador, não se mete com política. Seu Otávio fala por experiência própria. Já viu muito político enrolar o povo. E, quando houve um plebiscito em Barreiros pra saber se a população queria ou não transformar o distrito em município, seu Otávio votou contra. Ele nem precisava ter ido; o voto não era obrigatório. Mas seu Otávio fez questão de ir votar porque achou um abuso a criação de mais um município em Santa Catarina. Pra que mais prefeito, vereador, secretários e tantos outros cargos? Seu Otávio teve vontade de ir pra rua gritar. Mas não foi; achou que não tinha mais idade pra ficar protestando. Seja como for, seu Otávio já anda pensando que o voto, no Brasil, devia ser facultativo. Já pensou que beleza? Não precisar mais sair de casa pra votar? Seu Otávio também acha que cada um devia fazer a sua parte; assumir responsabilidades. Que maravilha! Todos pensando no destino de todos, discutindo, planejando o lugar onde moram. Mas isso é um sonho distante. O povo ainda é educado pra delegar poderes; ainda não tá preparado pra assumir o seu destino – daí a necessidade de líderes. Seu Otávio não tem certeza. Desconfia, porém, que é por isso que as coisas tão do jeito que tão; ninguém abre a boca pra nada. Seu Otávio toma mais um traguinho, paga a conta e vai embora. Não gosta de perder tempo com política.

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